Helena
Vieira
da
Silva
Coming soon
A componente têxtil e o uso de materiais como a madeira atravessam grande parte do trabalho de Carla Rebelo, sendo um dos seus elementos mais reconhecíveis o fio de algodão. As relações que estabelece com os materiais acabam por ser importantes na construção da noção de tempo nas suas obras. É o caso da escultura Livro de Horas, que simboliza a passagem do tempo através da proximidade da trama dos fios e da mudança de cor dada por um subtil degradê, tingido pela própria artista. A ideia de lugar permanece no livro-objeto, exemplo disso é Livro de Clio ou Pequeno Alfabeto de Arquitetura, um livro de artista com uma explícita referência arquitectónica, que ao ser desdobrado se confunde com escultura. Ou Livro de Polímnia ou Livro de Geometria (que pertence à coleção da Biblioteca de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian), um livro dedicado à musa da geometria, composto por seis páginas de madeira e papel com formas geométricas, e que cria mais uma vez a noção de espaço e de lugar tangível.
O percurso polivalente de Carla Rebelo também passa pela cenografia, destacando-se a peça de teatro A Viagem da Sónia Delaunay apresentada no contexto da exposição O Círculo Delaunay (2015), no Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa. A artista realizou peças cenográficas inspiradas nos quadros da pintora, mas onde se reconhece sempre a plasticidade e formalidade própria do seu trabalho.
A formação escolar de Rebelo passou pela Escola Artística António Arroio, onde concluiu em 1992 o curso de Desenho Têxtil. Hoje, é professora nessa mesma escola, na especialização Têxteis do curso de Produção Artística. Dentro destas práticas educacionais estão também as suas colaborações com o serviço educativo do Museu Nacional de Arte Antiga e do Museu Gulbenkian. Apesar dos materiais centrais com que hoje escolhe trabalhar serem os têxteis e a madeira, durante a sua licenciatura em Escultura na Faculdade de Belas-Artes de Lisboa (2000), escolheu estudar a resina e o plástico.
Como com qualquer artista, as experiências e interesses de Carla Rebelo influenciam a sua prática, e as residências artísticas que tem feito tanto em Portugal como no resto do mundo, são marcantes no seu percurso. Destaque-se o projeto Viagem ao Interior das Cidades Vividas, inspirado em Italo Calvino e no seu livro As Cidades Invisíveis, que envolveu estadias em diferentes cidades, como Madrid, Berlim, e Istambul.
“66 pregos em cada parede, 132 no total. Cada prego sustentará 2 fios, cada fio será suspenso por um peso de 40 gramas. 254 fios, 10,56 quilos. Estas são as coordenadas do espaço e do tempo da Geologia deste lugar”, é com esta descrição que a artista disseca a intervenção que fez na Casa A. Molder, em 2022. Estudando o espaço e a história das paredes das duas salas de exposição, parte de uma loja histórica de filatelia, em Lisboa, a artista requer que quem assiste tenha cuidado para não tocar na obra, fazendo um ritual performativo do seu próprio percurso. Neste sentido, a obra de Carla Rebelo existe em conjunto com o seu público, e é ativada e criada de novo, de cada vez que a vemos.