rosa ramalho e um oceano eduardo gageiro2

Rosa Ramalho

Galegos, 1888 – Galegos, 1977

Rosa Ramalho é a maior protagonista do Figurado de Barcelos, uma tradição neolítica de trabalho com barro, específica daquela cidade do norte de Portugal, que se distingue da olaria pelo seu carácter espontâneo, lúdico e não necessariamente utilitário.

As peças da barrista são enigmáticas e desconcertantes, confundindo livremente o quotidiano, o fantástico e a religião. Os “bonecos” com que modelou e expandiu a tradição e a imaginação são cristos, santos, diabos e alminhas, “bichos ferozes” e híbridos como lobisomens ou homens com cabeça de burro, mas também mulheres em carroças de bois ou crianças em bicicletas, figuras que evocam e misturam as narrativas e rituais ancestrais da região.

Essenciais na forma, mas com pormenores grotescos e inesperados, as suas peças variam entre o ocre monocromático e o profusamente colorido. Obra singular, de um expressionismo excêntrico e surrealizante, foi inicialmente apoiada por artistas contemporâneos – primeiro por António Quadros e depois por Ernesto de Sousa, nas décadas de 1950 e 60 – no âmbito de um movimento etnográfico que promoverá a abolição de fronteiras entre arte popular e erudita, e que dignificará a primeira como “arte ingénua”, livre dos códigos da arte moderna e contemporânea.

Lígia Afonso
[Plano Nacional das Artes e Fundação Calouste Gulbenkian]
Curadora, professora e investigadora nascida em Lisboa em 1981
Texto originalmente escrito para a plataforma Google Arts & Culture a propósito da exposição "Tudo o Que Eu Quero, Artistas Portuguesas de 1900 a 2020", comissariada por Helena de Freitas e Bruno Marchand
Retrato
© Eduardo Gageiro